quinta-feira, 15 de julho de 2010

Areiópolis parte III - O perfil da violência

Leia antes: AREIÓPOLIS - Parte I
AREIÓPOLIS - Parte II: Cana e Pinga

Todos de baixo para cima no Especial AREIÓPOLIS

Meus amigos em Areiópolis desempenham profissões sem grande glamour, mas honradas e que em uma cidade pequena dão um razoável padrão de vida. Um é mecânico, outro carteiro, outro enfermeiro, um trabalha na lavoura, outro é marceneiro, um é padeiro, alguns são funcionários públicos e, finalmente, alguns têm seu próprio negócio, dos mais variados. Meus irmão são, como eu, professores. De modo geral, essas pessoas formam um tipo de classe média da cidade. São os que tem poder aquisitivo para consumo além do básico, conseguem certo movimento na economia. A diferença de uma cidade pequena para a grande não é muita. Se na cidade pequena se ganha pouco (ou relativamente pouco) também se gasta pouco. A maioria dos meus amigos vai almoçar em casa; comida feita pela mãe ou pela esposa – o deslocamento é fácil e é praticamente impensável tomar café da manhã na padaria, não faz sentido.
Anos atrás, conversando com colegas de outros tempos (alguns que se tornaram policiais e outros saudosistas dos tempos em que a violência era circunscrita aos trabalhadores braçais e à questão doméstica) me disseram que a disseminação das drogas era um problema sério da juventude da cidade. Areiópolis já não é mais a mesma. Não há tanta dependência da safra agro-industrial na cidade (ainda existe, mas numa proporção menor), a mecanização do campo diminuiu a necessidade de incremento de trabalhadores, nitidamente a migração nordestina para o sudeste cessou, os bares são pouco e decadentes, um ou outro botequeiro consegue hoje benefícios políticos. Mas, os problemas gerados pelas dores do trabalho braçal existem porque a cidade tem sempre seus trabalhadores ligados aos serviços pesados. O que tem ocorrido é uma migração do consumo excessivo de álcool para o uso de maconha. A maconha exerce o mesmo efeito na musculatura que o álcool. É melhor no sentido de provocar um relaxamento psíquico também que inibe a violência. Portanto, é bem mais raro ver brigas em bares e violência doméstica tendo o álcool como fator detonador. Mas, a maconha provoca a busca por uma sensação cada vez mais renovada do “barato”. Vem a cocaina o crack. Com isso vem a dependência e a perda de produtividade no trabalho. O desemprego e a necessidade de comprar a droga. A violência em Areiópolis também chegou à classe média.
Os homicídios em Areiópolis não passam de 1 por ano. Hoje. Durante muito tempo foi menor raro acontecer algum. Mas, furtos, roubos e pequenos delitos são cada vez mais freqüentes. A droga, ao contrário do álcool gera um tipo de dependência e de contato com o ilícito.
Esta violência que encontrávamos na rua, relacionadas ao álcool agora dão lugar aos problemas que outros lugares enfrentam com as drogas. Com a diferença em que a cidade não é bem estruturada para lidar com o problema. Um viciado em Areiópolis esta jogado à própria sorte. O estigma em uma cidade pequena é devastador. Os comentários, as condenações, o suicídio social é inevitável. A não ser que grupos comecem a se formar para encarar o problema e formar. Não demora muito para que algum desses grupos comece a se organizar para receber e difundir as drogas.
Para alguns isso virou negócio, para outros ainda é lazer e inofensivo, mas tudo acaba por gerar uma nova forma de sociabilidade que tem a delinqüência como referencia. Bem diferente dos outros tempos. Melhor ou pior? Só posso afirmar também naquela cidade pequena a violência tem outro perfil – agora associada ao consumo de drogas.

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