
Flor do Deserto é a filmagem do livro homônimo de Waris Dirie; uma espécie de autobiografia da modelo. História de uma menina somalí prometida em casamento aos 12 anos de idade, que foge de uma família nômade para a Capital Mogadíscio, dali para Londres, onde é descoberta pelo fotógrafo Terence Donovan e vai para o mundo da moda.

Vejam senhoras e senhores, Alerto: o filme não pode ser visto pelo alto de nossa pretensa superioridade ocidental. Devemos respeitar culturas com tradições milenares e o modo como se relacionaram e se relacionam com seus ambientes. Intervir, violar essas culturas, opinar demais ou impor comportamento sempre acaba em confusão. A Europa em particular (e as potencias do resto do mundo em geral) já violou demais e criou muitos problemas à África. Não se trata de condenar, julgar ou ridicularizar a prática. Mas, é necessário exigir mudanças. Em 2007 o Egito criminalizou a mutilação da genitália feminina. A campanha internacional da ONU merece crédito e respeito.

O ritual pode se justificar cultural, funcional ou socialmente segundo uma tradição cultural que devemos respeitar. Mas, o mundo, desde tempos primordiais "mudou". É uma questão delicadíssima em que o consenso é difícil de aparecer. Antropólogos de todo o mundo se desentendem sobre a questão dos limites da imposição aos costumes dos povos. Estão em questão os limites da intervenção ocidental, os limites das ações ditas humanitárias. Dificil dizer onde a intervenção é necessario e onde é invasiva.
Mas, neste caso, mesmo Jean Claude Levi-Strauss, maior antropólogo relativista, fundador do estruturalismo, mente brilhante do século XX foi uníssono na condenação à mutilação da genitália nesses rituais. O fundador de uma visão relativista do mundo afirmando que mesmo o relativismo tem seus limites.
Waris Dirie juntou-se a BBC para um documentário sobre sua história de vida. Fez parte da série “The day that changed my life” – produziu A Nomad in New Yourk que promoveu o reencontro da modelo com sua família. Ainda não consegui localiza o filme. Mas, minhas buscas na internet continuam (quem encontrar me passa!).
Concluo retomando dois pontos fundamentais e que tornam o filme imperdível – mesmo eu próprio sendo contra essa máxima dos filmes necessários. Primeiro, não assista o filme como a história de uma princesa que ganhou na vida depois de muito sofrer. Waris Dirie não precisa de sua aprovação, nem do seu sentimentalismo barato – o filme tem questões mais importantes a tratar, a modelo é um veículo e não a história central do filme. Dois, ou segundo: devemos sempre tomar cuidado com nosso egocentrismo ocidental. Considerar aquelas culturas atrasadas ou impróprias se baseado exclusivamente em um ritual é ridículo. Evolução, progresso e desenvolvimento são questões próprias ao mundo eurocêntrico e nunca universais. Com certeza, se procurarmos um pouco, nós vamos encontrar rituais bastante bárbaros em nossa cultura. Temos ganhos e perdas a partir de nossas tradições, não somos nem piores e muito menos melhores que os povos nômades africanos.
- Para quem quer saber mais. Acesse a Fundação Waris Dirie
- Livro: Desert Flower – Waris Dirie e Cathleen Miller- Livraria Martins Fontes: R$ 38,00
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