
Claro que como morador de republica masculina, praticamente debutantes na arte de se virar sozinho na cozinha e dividindo a casa com vários outros colegas na mesma situação, coisa boa não pode sair. O fato é que a louça era uma fauna muito articulada. Ninguém era muito amigo da bucha e do sabão e as histórias são as mais diversas a respeito dessa parte da casa que nos era inóspita. Uma vez, a copa da pia chegou a descolar por conta do excesso de louça acumulada. Em outra situação, tomamos uma medida drástica, quebramos inúmeros pratos e copos, deixando apenas uma dúzia de cada pra que as pessoas se obrigassem a lavar os sujos ao invés de sempre buscar um limpo no armário antes de pensar em lavar e usar ou, corretamente, usar e lavar.
O fato é que morando na Casa dos Dez – às vezes com dez, às vezes com onze, já chegou a doze – nunca se sabia exatamente quem havia começado o caos. Mas, na medida em que o monte de louça suja começava a crescer inevitavelmente ninguém mais se dava conta de lavar. Aí, enquanto a faxineira não aparecia nada de limpar. Dona Jô chegava a gastar umas duas horas só pra dar ordem na cozinha. O resto era administrável... eu acho!
Vivendo e aprendendo. Confesso que nunca fui dos mais regrados na louça, mas também nunca me queixei de limpá-la. Não sou daqueles que uso e limpo – deixar pra um pouco mais tarde faz bem, afinal depois do almoço dá uma preguicinha. Diante disso, o fato é que outro dia, voltei à república e muita coisa havia mudado. Moradores diferentes, alguns insistentes antigos, mas depois de anos de transformação, converteu-se em uma habitação de pós-graduandos, gente mais velha, bolsistas com alguns recursos a mais que aquele bando de pé rapado dos meus tempos de graduação. E a louça! A cozinha sempre limpa a ponto de eu me sentir na obrigação de manter...

Nos tempos áureos de república, um começava, nem sempre o mesmo, nunca pelo mesmo motivo, mas bastava um começar a deixar a louça suja pra que o vício se espalhasse como um vírus. Também se tornava uma prática: se ninguém limpa por que eu vou me preocupar em limpar? Confesso que era mais cômodo assim só em um primeiro momento, depois a bagunça geral gerava incômodo coletivo e tornava-se pauta de inúmeras reuniões que muito se falava e pouco se resolvia.

Mas, caro leitor, claro que a louça é só uma alegoria das mil faces de tantas coerções que a sociedade nos apresenta.
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