quarta-feira, 28 de abril de 2010

Adicto: o escravo da contemporaneidade

Adicto vem do latim addictus: que significa algo como entregue a alguém como escravo. O termo hoje é usado para descrever o dependente químico de drogas. Mas pelo que entendi em sua abrangência pode significar compulsões de diversos níveis onde a ansiedade pode gerar sofrimentos aos doentes.
Assim que boa parte da psicologia tem tratado hoje o portador de dependência química, como um doente crônico. O problema é que a origem desta doença é menos biológica que social ou psicológica. Ou, o fator que detona as crises é um fator externo ao corpo e a biologia e ligado ao individuo e/ou à sociedade. Embora se discuta o componente genético da propensão (repito: propensão) ao vício.
Um adicto é um compulsivo, sem limites e que não calcula a conseqüência dos seus atos nos momentos de crise. Portanto, alguém viciado em drogas fará tudo para conseguir a droga no seu momento de crise ou abstinência. Assim as mais diversas dependências podem manifestar-se. Alguém viciado em remédios fará qualquer coisa para consegui-lo. Ou o alcoólatra. E mesmo o chocólatra. Claro que você há de convir que temos mais predisposição em considerar o viciado em drogas como um doente do que o viciado em cacau.

Enfim, o fato novo é que hoje em dia as pessoas adquirem vícios com mais facilidade e numa diversidade criativa nunca antes observada; e este sintoma pode estar nos alertando que algo anda estranho no reino da Dinamarca – ou seja: o mundo contemporâneo pode estar estimulando essa propensão antes oprimida. Dia desses, não me lembro em que programa de TV, vi uma reportagem sobre os viciados até mesmo em exercícios físicos.

Certamente os psicólogos concordam que as crises de ansiedade fazem com que os portadores procurem amenizar essa sensação de angústia consumindo seu vicio. O que não se sabe é o que causa essa crise de ansiedade ou que fatores levam a uma ou outra escolha. Podem ser fatores de ordem social. Podem ser fatores de ordem psicológica. Mas, também se discute o fator biológico dos casos. Existiria (e qual seja) algum componente genético na propensão compulsiva do adicto? Há quem garanta que sim. Mas, se existir a propensão, isso não garante que todos que tenham a propensão vão desenvolver esse traço como doença.

Rigorosamente falando, drogas são aquelas substancias que alteram artificialmente as funções corporais e que passado seu efeito é limitado no tempo. Se se faz uso de uma substancia por tempo prolongado as doses tendem a aumentar para causar o mesmo efeito. Assim, todos que tomamos medicamentos estamos fazendo uso de drogas. Como são controladas, consideramos perfeitamente legitimo este uso. Mas na medida em que abusamos do uso de determinadas substâncias, ou seja, passamos de um uso controlado para um uso condenado socialmente, estamos ultrapassando uma fronteira moral e alimentando uma compulsividade considerada vicio. Basta lembrar dos sete pecados capitais. Todos (ou maior pare deles) é uma prática cotidiana que se torna pecado pelo exagero: gula, luxúria, preguiça, vaidade.

O adicto é aquele que, além de ultrapassar as fronteiras do considerado lícito, legal ou legítimo tem determinada compulsão. Portanto, não seria qualquer usuário o adicto, mas apenas aqueles que transformam a satisfação da sua compulsão em imoralidade. O estigma determina o adicto, não a compulsão. Portanto, os compulsivos por chocolate, academia ou por brócolis podem respirar aliviados, não sendo uma compulsão condenada socialmente, portanto, não estigmatizada, não causa tantas mazelas como as condenadas. Doença mesmo é dada pelo sofrimento que o processo causa: seja no seu usuário, seja nos próximos do seu convívio.

O problema no caso do adicto é o ciclo vicioso – que cedo ou tarde vai se manifestar como uma disfunção problemática: uso determinada substancia porque estou ansioso, a substância alivia minha ansiedade, então reencontro certo equilíbrio entre meu eu e a sociedade. Aos poucos o uso vai se tornando mais freqüente e necessário para compor o mesmo efeito. Ou pior: se de repente uso alguma substancia que é reprimida pela sociedade... tento esconder, portanto. E isso me causa mais ansiedade. Então, aquela dose não faz o efeito que eu gostaria, busco mais e tenho mais medo. O que, mais uma vez aumenta minha ansiedade... fecha-se o ciclo.

Este é o ciclo das drogas ilícitas. Maconha, cocaína etc. Evidente que tem um componente transgressor no consumo das drogas ilícitas que não existe no consumo de drogas lícitas. Tomar remédios para dormir é perfeitamente legítimo. Não aumenta a ansiedade pelo próprio consumo da droga, só é necessário, de tempos em tempos, rever a dose com seu psicólogo.

O problema é que a origem desta doença é menos biológica que social ou psicológica. Ou, o fator que detona as crises é um fator externo ao corpo e a fisiologia não explica. Manifesta-se no consumo de medicamentos ou subterfúgios como cigarro, bebida, comida, esporte etc é sempre uma fuga e agrava-se com o aumento das doses necessárias para satisfazer o problema.

Alguns de nós considerados normais, depois da hesitação perfeitamente compreensível, enfrentamos nossos problemas. Outros ainda preferem recorrer ao apoio de subterfúgios que os distanciam da necessidade de encarar seus embaraços. No caso dos considerados “doentes” seus problemas adquirem tamanha gravidade que o entorno se compromete. Família, amigos e outros envolvidos acabam por sofrer as conseqüências da dependência que algumas pessoas criam em relação às drogas. Ou seja, a diferença de um adicto para uma pessoa normal, não é o uso que faz de substâncias químicas ou procedimentos sociais é o comportamento compulsivo e progressivamente danoso que o uso ou o comportamento adquire.

Quantos bandidos não nascem porque precisam comprar drogas e usam dinheiro roubado para isso? Pra não falar dos que tomam emprestados da família ou dos amigos pra isso. Quantos não mentem, não enganam, não sentenciam ou criam factóides para justifica seus vícios? Imaginem o quanto de sofrimento se constrói em torno de uma compulsividade mal resolvida. Claro que as drogas certamente lideram os problemas adictos. São seguidas proximamente pelo álcool. Depois as compulsões por medicamentos e não podemos esquecer as menos comuns mais igualmente sintomáticas compulsões por comida, jogo, consumo, sexo ou práticas esportivas.

O fato é que cada vez mais nossa sociedade padece de ansiedade. Sintoma presente em muitos grupos sociais habitante das concentrações urbanas. Esse é um tema tão interessante que em alguma medida, todos podemos nos identificar nele. Sempre temos algum mecanismo de fuga. E isso, provavelmente nunca foi um problema, mas uma solução que encontramos para desligar um pouco e colocar as idéias no lugar. Ser torna problemas quando a prática da fuga se torna o normal e a falta de enfrentamento um problema. Neste caso, o componente genético pode se comprovar como uma propensão ao compulsivo que é reforçado pela necessidade de aliviarmos a pressão cada vez mais forte presente no cotidiano. Se assim for, teremos cada vez mais doentes, pois se existir o crescimento genético da propensão à compulsão, somada a nossa opressão contemporânea, temos a fórmula perfeita para o crescimento do caos urbano. E, do que é pior, de uma propensão muito séria em desmobilizar os frágeis laços de solidariedade que nos une.

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