quinta-feira, 4 de dezembro de 2008

O filosofo e seu papel social

Na platéia dos jogos olímpicos, quando Pitágoras foi questionado por Leon, príncipe de Pilos, como ele se descrevia, e ouviu a seguinte resposta: “Eu sou um filósofo”; mas Leon não sabia o significado da palavra, que nunca ouvira alguém pronunciar:
“A vida, príncipe Leon, pode muito bem ser comparada a estes jogos. Na imensa multidão aqui reunida alguns vieram à procura de lucros, outros foram trazidos pela esperança e ambição da fama e da glória. Mas entre eles existem uns poucos que vieram para observar e entender tudo que se passa aqui.
“Com a vida acontece a mesma coisa. Alguns são influenciados pela busca de riqueza, enquanto outros são dominados pela febre do poder e da dominação. Mas, os melhores entre os homens se dedicam à descobrir os segredos da natureza. Este tipo de homem eu chamo de filósofo, pois embora nenhum homem seja completamente sábio, em todos os assuntos, ele pode amar a sabedoria como a chave para os segredos da natureza.”
(extraído da página 31 do livro: O último teorema de Fermat; de Simon Singh)

Me parece muito interessante a declaração de Pitágoras. Só não concordaria que os filósofos são os melhores dos homens. São raros, e são mais raros entre os filósofos os que não são dominados também pelo dinheiro ou pela fama (principalmente esta). Mas, os poucos que realmente amam a sabedoria são figuras raras. Nem melhores, nem piores – diferentes.

Amar a sabedoria, o conhecimento, comprometer a vida nisso não torna uma pessoa melhor que as outras. Embora a torne diferente da maioria, não faz com que uma pessoa seja melhor. O fato de produzir, coordenar e tratar de assuntos do interesse coletivo é necessário em todas as sociedades, são os abusos e o aproveitamento das situações que dissimulam a realidade. Um filósofo por vezes é um ser improdutivo e avoado o suficiente para organizar a vida social. Esse passa a ser o papel dos políticos. De qualquer modo, nas sociedades onde a divisão do trabalho se sobrepõe, todos têm papel importante e necessário. Se há tempo para filosofar, melhor; mas há sempre um agricultor para cultivar a vida de um ser pensante. É evidente que em uma sociedade que reserva ao filósofo um espaço no Coliseu, há muito avanço social, mas sempre há um custo para isso; alguem paga essa conta.

A única coisa que lembro da minha formatura foi o discurso do professor homenageado da turma de sociologia, um filósofo formado também em direito. Disse ele que pelos sessenta a faculdade de filosofia da USP formava em torno de quatro pessoas por ano. Um desses heróicos estudantes era imediatamente contratado pelo departamento para tornar-se professor. Outro certamente iria complementar seus estudos com uma bolsa de pós-graduação no exterior. Um terceiro conseguia fácil um emprego na editora Abril. Já havia sempre um quarto que vagava de rua em rua, sarjeta em sarjeta, bêbado, sujo e maltrapilho. Talvez, completou o professor, o mais filosófico de todos seja o nosso quarto formado. Ao final, concluía: no mundo não há lugar para um grande filósofo.

Como acabou a própria escola pitagórica, todos sabemos: queimada; dentro alunos, professores e livros. Os poucos restantes foram perseguidos e dizimados. O fato é que nem na Grécia antiga e menos ainda no Brasil contemporâneo este tipo impar de ser humano encontra seu espaço na sociedade livre de conflitos. São vastas as histórias de que os maiores expoentes têm seus feitos imortalizados, reproduzidos e estudados todos os dias e no mundo todo por alunos desde a formação básica até a universidade. Mas, também são protagonistas das maiores tragédias pessoais e injustiças de que já se teve notícia.

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