segunda-feira, 20 de fevereiro de 2012

Dos perigos do apoio à higienização

(Publicado no Jornal da Tarde de 20 de fevereiro de 2012, página 2A da edição n.15155)
Por Luis Fernando Vitagliano*

Pelo menos três fatos bárbaros provocados pelo próprio Estado aconteceram no Brasil recentemente: a política de “limpeza” na área da Cracolândia em São Paulo, a desocupação de posse do Pinheirinho em São José dos Campos/SP e os pelo menos 120 assassinatos (maioria moradores de rua) na Bahia, desde que a greve da Polícia Militar daquele estado começou.

Muitas pessoas apoiam e/ou concordam com as ações truculentas e intempestivas do Estado para alguns desses casos. Fato este verificado através de pesquisas de opinião que invariavelmente estimula os governadores e políticos a agirem com violência junto à pequenas parcelas da população marginalizadas pelo sistema social brasileiro. Mas, o que deixamos de considerar nesses casos é que, sujos ou moribundos, drogados ou ilegais, moradores de rua ou de ocupações, todos, repito, todos são cidadãos brasileiros. E cabe ao Estado tentar proporcionar níveis de bem estar social a essas pessoas, segundo garante a própria constituição do país. Não é papel das políticas públicas fazer dos marginalizados vítimas ainda maiores do nosso sistema desigual e opressor.

O que podemos nos perguntar para casos como esses é se as pessoas envolvidas (moradores de rua, drogados, ocupantes de favelas e cortiços), são criminosos ou vítimas de um sistema que não garante direitos e oportunidades a todos os cidadãos?

É obvio que existem muitos brasileiros egoístas e mal caráteres, mas assim como em todas as sociedades, isso não é privilégio dos pobres. Entre ricos e principalmente entre políticos há uma enormidade de privilegiados pelo dinheiro e desprivilegiados pela dignidade. Nem por isso o Estado age agressivamente contra esses também. E esse é o ponto. O que é justo?  Será que é justo “limpar” a sociedade de delinquentes, moradores de rua e drogados porque a presença deles incomoda nosso visual?

Preocupa-me e muito o apoio da população aos atos criminosos praticados pelo Estado brasileiro recentemente. Tirar pessoas da rua contra sua vontade, entrar em casas, sacar famílias dos lugares e não permitir que levem seus bens, internar outros contra sua vontade ou se aproveitar de uma greve da polícia para assassinar moradores de rua são atos vândalos e baixos que não podem passar impunes ou sem condenação na sociedade.

Em 2014 teremos Copa do Mundo. Em 2016 teremos Olimpíadas. Ambos os eventos no Brasil. Muita gente que estará preocupada com a imagem que o país transmitira ao mundo não vai medir seus atos para camuflar a realidade. Pois eu prefiro transmitir a imagem de um país desigual, com muita pobreza e delinquência, como realmente somos a transmitir uma falsa imagem de desenvolvido às custas de maior sofrimento e agressões contra cidadãos brasileiros pelo miserável fato de serem marginalizados.

*Doutorando em Ciência Política na Unicamp e professor do curso de Relações Internacionais na FMU

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