sexta-feira, 24 de junho de 2011

X-Men: Primeiro Classe e a crise que atinge a autoimagem nos EUA

Joseph Nye diria que o soft power é mais eficiente que o hard power: mesmo que um não substitua o outro, ou que uma potencia não sobreviva sem ambos. Nye é uma das sumidades das teorias das relações internacionais – goste de suas ideias, como a maioria das pessoas, não goste como eu e alguns poucos, não fiquemos sem lê-lo.

Mas, vamos direto ao assunto desta postagem antes que o inquieto leitor manifeste estranhamento total; se a resenha é sobre o novo filme dos X-men, o que Nye tem com isso? Tudo e nada. Tudo porque pode nos ajudar a entender o atual contexto dos EUA. Nada porque não é exatamente sobre Hollywood, cinema e Marvel que Nye escreve. Evidentemente a indústria do entretenimento é elemento constitutivo do soft power, mas não é exatamente isso que se faz em Hollywood quando um filme é lançado. Principalmente se supormos que as histórias da Marvel seguem o roteiro previamente contado nos gibis dos anos passados.

O fato é que o novo filme dos mutantes fala, e muito da relação dos Estados Unidos com o “resto” do mundo. Tem pra todo o gosto: Alemanha, URSS, Cuba, nazistas, guerra fria, minorias, maiorias, normais, evoluídos, comunistas e libertadores; é uma salada russa e sem trocadinhos.

Numa primeira análise – digamos de cultura política – o mundo pode ser dividido entre os “normais”, sem mutações genéticas e os “mutantes”, com variações enormes de habilidades e possibilidades. Consciente ou não, pode ser uma alegoria das individuações modernas. Ou do que muitos intelectuais chamam de pós-moderno. Não gosto do temo pós-moderno, mas entendo que na contemporaneidade há mais que as possibilidades tradicional vs moderno. Existe uma variação enorme de opções de individuação e o crescimento qualitativo e quantitativo das minorias tem criado novas condições sociais no mundo todo.

As duas primeiras “minorias” que se rebelaram foram as mulheres e os homossexuais. Num mundo ocidental dominado pelo machismo, as mulheres que buscavam emancipação tiveram aos poucos espaço conquistado. Claro, não estamos ainda falando de minorias no sentido estrito, mas de opressão de uma categoria social que ditava regras pela conduta do machismo. Depois veio a liberdade sexual e com isso a luta de gênero. Os homossexuais, os transexuais e assim vai. Hoje são os roqueiros tattoados, os  Emos, os Grunges, os skatistas ... e cada grupo com sua cultura. São alegorias de X-Mens, típicas individualidades que buscam parcerias e espaço no mundo dos normais.

A classe média careta e quadrada tem perdido espaço na sociabilidade e reagido, como é de se esperar, agressivamente. Elegem políticos conservadores, apoiam declarações e projetos de lei homofóbicas, defendem políticas xenófobas e por ai vai. Sempre há reação e repercussão entre os “mutantes” e a trama política se faz.

No novo filme da série fica explicito o fato dos EUA serem o lugar onde a liberdade dos mutantes pode e deve ser preservada para que seja negociada entre o resto do mundo. O nascimento da escola do professor Xavier, a relação de acolhimento que ele estabelece com os outros mutantes, a participação e depois o segredo em relação à CIA (agencia de segurança), Tudo está ali na terra onde o bastião é a liberdade. No melhor estilo soft power de Nye, corre um filme para o mundo dizendo que àqueles que tem poderes melhorados, os EUA é a terra do acolhimento – e isso apesar dos “normais” daquele próprio lugar ainda não entenderem. De todos os regimes, o único onde é possível encontrar brechas é a democracia da América. É isso que o filme transparece, mas não necessariamente aquele roteiro tenha compromisso com a realidade.

No fundo todos sabemos que a crise de hegemonia do big brother não pode ser combatida apenas com as guerras e então o soft power entra em jogo mais que nunca.

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