sábado, 24 de julho de 2010

Areiópolis Parte IV: o poder público

Cidades pequenas como Areiópolis têm poder muito concentrado. Hoje, com a modernização da política e a necessidade de institucionalização, destaca-se o poder público. Se antes, algumas famílias eram os grandes concentradores de poder, hoje essas famílias buscam, mais que fazendas de café (terra) ou comércio, mas os cargos públicos. Assim, uma forma de ascensão social é ocupar postos públicos onde o salário é garantido, há estabilidade de emprego (em níveis federal e estadual) e a resistência para encarar uma crise era grande.
Este é um procedimento muito comum em qualquer lugar. Funcionários públicos de status tem poder e posição no Brasil. Mas, ali, todo o pequeno cargo ganha proporção ampliada. Quando eu era criança a cidade tinha 4 ou 5 policiais militares que se revezavam no patrulhamento da cidade. Hoje o efetivo está, provavelmente, o dobro ou mais. O delegado de polícia tem poder judiciário, porque é a única autoridade municipal que faz o cumprimento da lei penal. Em cidades onde não há Fórum, o exercício do poder judiciário cabe aos municípios maiores próximos que em geral não fazem parte do cotidiano das cidades pequenas. Os vereadores enxergam o legislativo como um trampolim para o executivo. Vereador em cidade pequena é político de segundo escalão ou com a carreira em ascensão. Se estão na fila de espera do poder político local, mas têm pouca influencia política, o fundamental é que almejam o executivo. De fato o poder principal de um município pequeno está no prefeito. Não tanto pela força econômica (até mesmo a corrupção do cargo é sazonal), mas principalmente porque a posição do prefeito pode tornar muita gente funcionário público.
Neste sentido, Areiópolis não é exceção, estou tratando de uma realidade que, mutatis mutandi, é característica de metade dos municípios brasileiros, que dos 5561 existentes, pelo menos metade disso tem população igual ou inferior a 20 mil habitantes. Se eu substituir o nome da cidade por qualquer outra com características próximas, esse arranjo político permanece. Pode parecer estranho ao leitor, mas a quantidade de cidades nesta posição é grande, embora se somadas as populações dos pequenos municípios, ela não exceda 25% da população nacional. Assim, se a quantidade de cidades nesta situação é maioria, esta maioria não se reflete em quantidade, ao contrário, é um estilo interiorano estranho à maioria dos brasileiros.
O poder público que atua numa cidade grande é diferente. Em alguma medida, mais institucionalizado e impessoal. Em alguma medida, porque sabemos que não é bem assim. No Brasil, o rei sempre tem amigos. Mas, os cargos pequenos, cotidianos não representam ascensão social. Em Areiópolis, ser professor primário pode significar nunca mais trabalhar em serviços domésticos.
Além de que, praticamente metade da população de Areiópolis depende do setor público. A maior proporção dos empregos vem do serviço público. Seja municipal, seja estadual. O município é dono de pelo menos um quarto dos empregos locais. E isso gera certa centralização das decisões sobre a vida das pessoas nas mãos dos prefeitos. Claro que o prefeito tem que cumprir normas e procedimentos, que há fiscalização, mas em seu poder consegue complicar bastante a vida de cidadãos e famílias.
Se considerarmos que, de modo geral, os ocupantes dos cargos públicos são ainda famílias e grupos que se alternam no poder, conta-se com poucos dedos as figuras influentes. Evidentemente que a necessidade de seguir normas e procedimentos se faz maior hoje que há 20 anos, mas sempre é possível encontrar brechas. O que me impressiona nas cidades pequenas é esta articulação de grupos poderosos com o pode público, que supostamente não pertenceria a ninguém, mas seria impessoal, meritocrático e democráticos. Se isso em Areiópolis esta pouco evidente, pena que esta não é uma exceção, mas outro caso corriqueiro no Brasil.

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