domingo, 6 de setembro de 2009

O dilema entre o cálculo político e a ética em Lula

(o artigo abaixo foi enviado aos editores do Jornal da Tarde já faz um tempo. Pouco mais de um mês. No retorno me pediram para fazer mais análises. Fiz muitas perguntas e pouca análise. Pediram pra eu reformular. No final, fica dificil escrever sobre um assunto tão complexo como a crise do Senado, em 2700 caracteres e que não caia na mesmice, nos chavões ou na leviandade. Tentei fazer outras análises, mas a sucessão de crises sempre acaba desatualizando qualquer análise cotidiana que não tenha por propósito colocar ainda mais lenha na fogueira. Já que analisar anda tão dificil, decidi postar meu artigo cheio de perguntas aqui no blog)
Deve o Presidente da República interferir na crise do Senado de modo a sustentar a permanência de José Sarney como presidente daquela instituição? Deve, pode ou até mesmo tem o direito o Presidente Lula, em nome da governabilidade, defender Sarney em detrimento da idoneidade, da justiça e dos valores da república?
Já existem argumentos que justificam o afastamento de Sarney do seu cargo em respeito às apurações. E, dada a proporção que tomaram os escândalos, não é exagero defender que a renuncia de Sarney seria a postura mais digna. Também não é demais conjecturar que se não fosse a interferência do presidente Lula na defesa do senador, a correlação de forças tenderia para punições e não para o abafa com tem se desenhado.
Entretanto, este não é um artigo sobre a crise do Senado, nem sobre seus desdobramentos, mas que questiona a interferência do chefe do executivo no processo. Com a entrada de Lula em defesa de Sarney e seu enquadramento na bancada petista exigindo fidelidade do PT ao governo e aos seus aliados, cautela, tem-se sustentado um quadro de impasse para a crise.
Evidentemente que Lula não se meteria em uma crise ‘normal’ do Congresso. Sabe que o legislativo tem uma dinâmica própria e delicada – aprendeu à duras penas. Só se arriscou neste caso porque seu elevado índice de popularidade o credencia. Também porque, e principalmente, quer fechar seu governo com mais realizações e sabe que um Senado oposicionista poderia complicar o final de seu governo. Finalmente, o presidente sabe que o cenário de renuncia de Sarney pode estremecer a já difícil relação entre PT e PMDB e complicar as alianças eleitorais em 2010.
Todo esse diagnóstico político que se passa na cabeça de Lula é uma análise realista. Porém, não leva em consideração questões que foram a marca do PT por décadas: a ética e a luta contra os métodos oligárquicos. Pode Lula ignorar suas bandeiras passadas? Suas atribuições de presidente permitem que isso seja feito? Essa é uma questão que o próprio presidente tem obrigação de responder. Mas, que antes leve em consideração que quando defende o ilícito, seja lá por qual motivo, dá exemplo negativo como figura pública. Ao defender incondicionalmente aliados, cega os olhos à pilantragem política e permite complacência com usurpadores. Ao defender o abafa, Lula prejudica a noção de que ninguém deve ter tratamento privilegiado diante de abusos na sua função pública. Senhor presidente: abandonar os princípios republicanos vale em função do cálculo político?

2 comentários:

O tempo de cantar chegou! disse...

Pois é.. e fica questão no ar..

Gostei do seu blog professor!

Maurão disse...

Gostei muito do artigo. Acho dificil encontrar algo prá ler parecido, com o mesmo ritmo, distância...

Curti muito, parabéns Luis!