
Talvez para nós brasileiros, que nunca passamos por esta situação, seja um pouco difícil imaginar ou dimensionar o que recentemente passaram os habitantes do Chile. Tomou conta do noticiário o terremoto chileno do início deste ano – um dos mais fortes desde muito tempo – pena que, com a mesma velocidade que as notícias tomaram conta da mídia, também sumiram.
Mas, ainda restam muitos resquícios e problemas oriundos do abalo sísmico. Estruturalmente as coisas podem, em algum tempo, se recuperar, mas marcas importantes, físicas e psicológicas vão permanecer.
Foram 2 longos e intermináveis minutos. Sobre eles, as impressões são as mais diversas. Um colega me contou que o barulho que a terra fazia era assustador. Um zunido interminável que vinha do chão tremendo que ele não podia jamais supor sem ter vivido aqui. Outra pessoa, uma estudante de biologia, dizia que se lembra do chão da rua ondulando – detalhe: imagine uma rua de asfalto ondulando como uma folha de papel. Um colega argentino me contou que estava no décimo andar de um prédio e que o movimento pendular do edifício chegava a um metro e meio – tudo bem, tango, drama, exagero, vamos dar um desconto – enfim, imagine sua casa movimentar-se um metro para direita e em seguida um metro para a esquerda. Ele disse que a geladeira – utensílio relativamente pesado – circulou pela cozinha até travar a porta, todos os móveis mudaram de lugar, tudo na casa ficou irreconhecível e, sem energia elétrica, sem luz, ficou impossível se localizar.
Uma garota disse que ao sair na rua, via as pessoas como zumbis, caminhando sem destino, incrédulas. Os serviços hospitalares funcionavam ainda que precariamente e toda a comoção que surgiu em Santiago, para ajudar as vitimas de Concepción, se explicam porque o sentimento de solidariedade desperto depois da tragédia foi mesmo que inevitável. Embora estruturalmente Santiago não tenha sofrido tanto quanto Concepción, o que as pessoas viveram em relação à tragédia foi forte o suficiente para sensibilizar-se. Houve, em diferentes lugares, diferentes visões sobre o acontecido.

Enquanto em Santiago o susto foi grande, mas a tragédia foi relativamente pequena, no outro lado esta Concepción que foi o epicentro do terremoto, uma cidade importante distante cerca de 300km de Santiago. Passando férias na região, uma colega disse que as pessoas vagavam na rua de pijama, errantes, sem destino, sem saber porque, sem a menor razão. Casas foram destruídas, edifícios históricos, construções antigas e com valor como memória cultural do lugar. E, com a demora na ajuda para os atingidos, começaram os saques e as brigas e por pouco o governo não perdeu o controle da situação.
Além disso, há a questão arquitetônica. Se acessarmos o jornal El Mercúrio, podemos ver as discussões que hoje surge entre os arquitetos chilenos para reconstruir o que foi levado pelo terremoto. A polêmica básica gira em torno do “reconstruir tudo o mais fiel possível ao que era antes” ou “remodelar, modernizar e criar algum tipo de memória que justifica essa renovação”. Para alguns arquitetos, o que foi não volta mais e a melhor maneira de recordar é apresentar uma perspectiva mais próxima esteticamente aos padrões, enquanto outros propõem recuperar os fragmentos tais quais haviam desabado. É um longo e frutífero debate que se estenderá e será decidido segundo a circunstância.
Algumas coisas que vi podem dimensionar melhor o estrago. Atualmente, alguns meses depois, contava-me uma pessoa que o atual asfalto trepidante que se percebe e a ondulação quando hoje se passa com o carro, aquilo, em Santiago, era fruto do terremoto, já que antes o asfalto era liso e praticamente não havia trepidações. O palácio La Moneda (onde Salvador Allende foi emboscado por Pinochet em 11 de setembro de 1973 e morreu ali), depois da ditadura aberto a visitações desde a redemocratização em 1990, estava fechado para reformas devido aos abalos provocados pelo terremoto. Estive na sede CEPAL (Comissão Econômica para a America Latina) e o segundo piso, onde funcionam praticamente todos os escritórios das divisões de investigação e o ambiente mais aconchegante da instituição estava fechado para reformas por conta dos estragos feitos pelo terremoto. Ou seja, aparentemente a vida corre normal no Chile hoje, alguns meses após o terremoto. Mas, se você conversa com as pessoas ou busca alguns lugares, percebe que o estrago foi e ainda é maior que o aparente. As pessoas ainda contam com muito sofrimento o que ocorreu.
Vi fotos que em Concepción, casas, casebres, museus e igrejas foram todos abaixo. Se no Brasil as notícias sobre o acontecido acompanham esta aparente superação chilena, não é o caso do que está hoje em pauta no país Andino. Há muita coisa estrutural que, não importa como, mas deve ser construída de modo a prevenir-se para outros fenômenos. Algumas pontes, rotas estradas devem ser construída rapidamente. Mas, outras estruturais têm um tempo mais elástico para se restabelecerem plenamente. Ai entra aquela briga arquitetônica, que se perdeu está realmente perdido ou seria importante um restauro que recuperasse o que foi antes do terremoto?
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